Foi só agora que me dei conta de que mataram o pé de
boldo. Na semana passada, o movimentar das máquinas, o remover a terra bruta na
descoberta do solo inculto, o aplainar imperfeições naquilo que a natureza
julgou perfeito, não me deixaram pensar que aquele pequeno arbusto colado ao
terreno de minha casa, estivesse ameaçado.
Entre os escombros, já havia visto o mamoeiro jovem,
com folhas ainda verdes, relegado ao abandono. Sim, aquele minúsculo pedaço de
terra ao lado, pequeno canteiro, oásis no meio de um deserto improdutivo, foi
por algum tempo útil. Produziu alfaces orgânicas e outras coisas boas de se
comer e também ajudou a curar muitas dores de cabeça da vizinhança. Por último,
o mamoeiro que ali florescia, de sementes jogadas a esmo, mas que não teve tempo
de mostrar a que veio.
Quando aqui chegamos, este terreno ainda abrigava palmeiras
onde um pica-pau, livre, fez sua casa. Certamente, deveria ter outras, nômade
que era, uma vez que o víamos apenas nos meses de junho e julho, tornando-se
mais presente por seu canto. Era bom ouvi-lo
no final do dia. Ele dava um ar bucólico ao que já era natural e, por sua
beleza e simplicidade, também nos trazia alegria. Quis Deus, no entanto, que o pica-pau
abandonasse aquela casa e, à força dos ventos de destroem casas de pássaros e
de homens, destruiu também a dele.
Como havíamos dito, por sua natureza leve e desapegada,
não se deixou esmorecer e do trabalhar por sua sobrevivência, construiu uma
nova casa na floresta o lado. Sei disso
porque estamos em junho. Sorte diferente
teve o pé de boldo e eu. Agora, no lugar da nova casa do pica-pau, um lugar
verde e protegido e que vê-lo da nossa janela já apaziguava a nossa alma nos
momentos de amargura, verei paredes e janelas e telhados.
No entanto, até quando durar a chama de vida do meu
amigo e viajante pássaro outonal, seguirei aguardando seu canto.
Frederico Ferreira
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